BD_Tech Lab #2: Habilitando futuros: como as tecnologias emergentes criam novas alternativas de negócio

Escrito por Júlio Feiden Sócio

    Por muito tempo, tecnologia foi sinônimo de infraestrutura. Era aquilo que sustentava o funcionamento das empresas, otimizava fluxos e tornava operações mais eficientes. Mas essa lógica já não é suficiente para lidar com um mundo em que a mudança se tornou permanente. A tecnologia, hoje, define o próprio negócio. É vetor de transformação, imaginação e construção de futuros possíveis.


    “Quando a tecnologia migra e se dissemina, precisa ganhar espaço nas nossas construções”, diz Kim Trieweiler, pesquisador da Guilda e especialista em Futures Studies. 

    “Acredito que ela é uma amiga do lugar e, ao mesmo tempo, ainda não entra no centro da discussão estratégica fundamental ou de novos negócios. Então, é preciso trazê-la para o centro da conversa de uma forma mais intencional”, complementa Trieweiler.


    De ferramenta a vetor de transformação


    Na transição do digital como suporte para o digital como estratégia, há uma mudança de mentalidade. As empresas que mais crescem não perguntam apenas “qual tecnologia usar?”, mas sim “qual futuro queremos habilitar?”. É uma diferença sutil, mas profunda, que separa a simples digitalização da verdadeira inovação.


    “Está no cerne da ideia de digitalização”, explica Kim. “Porque digitalizamos processos, e ao fazê-lo, estamos transformando um processo que já existia em um processo 2.0. Entretanto, não entendemos que essa mudança transforma completamente o negócio.”

    Ele cita o exemplo dos e-commerces, descrevendo o modelo digital de venda apresentado por muitos deles. Ao comparar com uma loja física, aponta as similaridades: 


    1. E-commerce tem um carrinho de compras;
    2. Banner que lembra uma vitrine; 
    3. Números das peças. 


    “Ele parece muito uma loja física. Mas existem modelos de negócio que são plenamente digitais.” Esse tipo de pensamento amplia o escopo da inovação: deixa de ser apenas melhoria contínua e passa a ser criação de alternativas reais. 


    Inovar é criar alternativas


    A ideia central dos Futures Studies, campo em que Kim atua, é justamente essa: enxergar a inovação como mecanismo de criação de alternativas. Cada nova tecnologia, seja IA, blockchain, realidades imersivas ou biotecnologia, amplia o campo de possibilidades do presente e redefine o que entendemos por valor.


    “As tecnologias não podem ser um acessório”, reforça Kim. “Elas têm que entrar no centro da discussão e no centro do negócio. Cada uma dessas tecnologias habilita negócios de forma diferente.”

    Ele menciona a realidade aumentada como exemplo dessa diversidade de usos: 

    “Se eu pensar isso dentro de uma indústria, por exemplo, já existe aplicação em que a pessoa que vai consertar uma máquina vê ali o que precisa fazer e é guiada no conserto através do óculos de realidade aumentada. Mas podemos pensar também na realidade aumentada no e-commerce de moda, em que a pessoa já experimenta a peça antes. São usos completamente distintos de uma tecnologia muito parecida.”

    A conclusão é clara: tecnologia não é só para otimizar, é também para criar alternativas.


    Futuros possíveis e a valorização da incerteza


    Os Futures Studies propõem uma inversão na lógica empresarial: em vez de prever o amanhã, eles buscam projetar futuros possíveis. Essa abordagem combina análise e imaginação e pode transformar empresas reativas em organizações exploratórias, capazes de liderar o que vem a seguir.


    Kim explica que o primeiro passo é tornar as equipes “mais letradas em futuros”. “O caminho é explorar todo o conteúdo disponível em diversas plataformas. A inovação já é uma temática mais difundida, e muitas pessoas conhecem seus métodos. O mesmo precisa acontecer com os estudos de futuros.”


    Mas ele alerta que pensar o futuro exige algo mais difícil: apreciar a incerteza. “O Ayalon Milgram fala que normalmente tratamos a incerteza como algo negativo, mas é na incerteza que existem espaços de transformação importantes. Quando buscamos tendências, geralmente estamos buscando certeza e aí acabamos criando o ‘mais provável’.”

    Nesse contexto, a ambidestria organizacional se torna essencial: melhorar o que já funciona bem, mas também explorar novas alternativas. “Esses cenários alternativos são futuros possíveis”, resume.


    Propósito e tecnologia como aliados


    Casos de empresas como Patagonia, Itaú e Natura mostram que é possível combinar propósito e tecnologia de forma autêntica. São organizações que experimentam novos modelos, prototipam futuros desejáveis e inspiram outras a seguir o mesmo caminho.

    “Essas empresas criam um senso de possibilidade”, observa Kim. “Porque, muitas vezes, até alguém fazer pela primeira vez, achamos que é impossível, que ninguém compraria, ninguém faria. Quando vemos uma empresa fazendo, ganhamos um senso de permissão: ‘Se eles fizeram, eu também posso.’”

    Essa “permissão para imaginar” é um combustível potente para a inovação e também um lembrete de que a tecnologia deve habilitar futuros no plural, não apenas um único caminho.


    “Passa por criar futuros que não eliminem outros futuros”, diz Kim. “Futuros que não impeçam outras pessoas de existir e atuar.”


    Do hype ao sentido


    Em um mundo guiado por tendências, talvez a pergunta mais relevante para líderes e empresas seja também a mais simples e a mais difícil:


    “Estou investindo nisso porque todos estão investindo, ou porque isso é importante para o meu negócio?”


    Como lembra Kim, “os negócios, às vezes, se inflamam pelo hype e perdem o foco e, quando isso acontece, vem também o desencantamento.”

    Pensar o futuro, portanto, é mais do que acompanhar movimentos tecnológicos: é dar direção a eles. É enxergar a tecnologia como mecanismo de imaginação estratégica, uma aliada na criação de alternativas que ampliam o campo do possível.


    E talvez essa seja a pergunta que define a próxima década:


    Sua empresa está usando tecnologia para melhorar o presente ou para projetar o futuro?


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